Agente de segurança pública e legítima defesa.

Recentemente, passamos às mãos do ilustre Professor Marco Aurélio Moreira de Oliveira, respeitada figura do cenários forense e acadêmico do Rio Grande do Sul, por provocação sua a respeito do enfrentamento ou não deste assunto em nossas Aulas de Legítima Defesa, a seguinte passagem delas extraída:

“Numa inovação desnecessária, pela Lei no 13.964/2019, foi acrescentado ao art. 25 do CP um parágrafo único com o seguinte teor:

“Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes”.

Desnecessária, uma vez que o art. 25 expressamente prevê a legítima defesa de terceiro, no que se inclui a conduta do agente dos órgãos de segurança pública quando intervém na defesa de direito de outrem injustamente agredido, com o unânime apoio da doutrina nacional.

A nova norma somente pode ser compreendida como norma explicativa, sem ampliar ou reduzir o âmbito de incidência da excludente. Em artigo publicado no sítio migalhas.com.br, sob o título Reflexões sobre a Lei 13.964/2019 (Pacote anticrime), Marques Castro escreve:

“Ou se trata de norma penal explicativa, e portanto não portadora de nenhuma novidade no sentido de expansão do conceito de legítima defesa penal; ou, tendo pretendido o legislador ampliar o conceito de legítima defesa especificamente para agentes de segurança pública, tal norma ressente-se de inolvidável vício de inconstitucionalidade, pois malferidora do princípio da isonomia, constitucionalmente prevista (art. 5o, caput). Explica-se. Ao preceituar que “observados os requisitos previstos no caput deste artigo”, o legislador estaria tão somente introduzindo norma de esclarecimento sobre o conteúdo do já tradicional conceito de legítima defesa previsto no art. 25 do Código Penal, informando aos operadores do direito que o policial que executa o autor de crime mediante a utilização de terceiro refém está agindo de acordo com a norma penal, desde que estejam presentes todos os requisitos da legítima defesa previstas no art. 25, notadamente a atualidade ou iminência ou atualidade de injusta agressão a direito de outrem. Contudo, dado inexistir controvérsia na sociedade civil a respeito da plena aplicabilidade do conceito de legítima defesa em favor de agentes de segurança pública, faz parecer que o legislador pretendeu, isto sim, preconizar uma espécie de legítima defesa apriorística, cuja atualidade ou iminência da agressão faria-se presente em qualquer hipótese de crime mediante a utilização de reféns, desde que o autor da conduta típica seja um profissional da segurança pública. Neste caso, parece de clara inconstitucionalidade a novel redação do parágrafo único do art. 25 do Código Penal, pois, além de exorbitar das balizas do devido processo legal substantivo (ou razoabilidade), o legislador também premiaria uma classe ou segmento de indivíduos, em detrimento tanto do restante da sociedade (um civil, na mesma posição do policial, praticaria crime ao tentar salvar a vida ou integridade física de terceiro em condições fáticas que, no caso do policial, seriam consideradas justas e suficientes para afastar a ilicitude do fato segundo o Código Penal).”

Discordamos, portanto, de que esta inovação traduza uma modalidade especial de legítima defesa cuja principal característica resida no aspecto temporal, como se agressão atual, agressão iminente e “risco de agressão” fossem fenômenos diversos: Enquanto a geral requer uma agressão atual (presente) ou iminente (prestes a ocorrer), a especial pode se configurar diante de um (mero) risco de agressão, isto é, da possibilidade concreta, dado o cenário existente, de que o ofendido, mantido como refém, possa vir a sofrer algum dano. Assim, por exemplo, dá-se a figura do parágrafo único quando um sujeito invade um estabelecimento empresarial, privando a liberdade de locomoção dos funcionários ou clientes, sob ameaça de arma de fogo e um policial, para libertar as vítimas, contém o agente, disparando contra ele. Haveria agressão atual à liberdade dos reféns e não um “risco de agressão”. Agressão atual é a agressão iminente, a já iniciada e que ainda perdura, caracterizada pela presença de um perigo concreto.”

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